O Ministério da Fazenda reconhece que o Brasil precisa de uma reforma ampla do Imposto de Renda para corrigir distorções no sistema e aumentar a progressividade da cobrança, mas afirma que esse debate não deve avançar durante o atual mandato presidencial. A avaliação é do secretário de Reformas Econômicas, Marcos Pinto, um dos responsáveis pela proposta de ampliação da faixa de isenção do IR entregue ao Congresso em março.

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“Esse tipo de reforma não se faz no meio do mandato. Envolve um pacto social, uma mudança profunda no padrão de tributação. Exige tempo e construção com a sociedade”, disse o secretário em entrevista.
A proposta enviada ao Legislativo prevê a elevação da faixa de isenção do IR para R$ 5 mil a partir de 2026, com isenção parcial para rendimentos entre R$ 5 mil e R$ 7 mil. Cerca de 10 milhões de contribuintes devem deixar de pagar o tributo. Para compensar a perda de arrecadação, o governo propôs tributar os chamados “super ricos”, com renda superior a R$ 50 mil mensais (ou R$ 600 mil ao ano).
No entanto, o texto não aborda a taxação de lucros e dividendos, tampouco mudanças no IRPJ, como havia sido proposto durante o governo Bolsonaro. Esses temas, segundo Pinto, demandam um debate mais longo e abrangente.
“A gente não pode esperar uma reforma total para corrigir uma injustiça evidente, como a faixa de isenção. Esse argumento de que só se pode mudar tudo ou nada é, na prática, uma forma de manter tudo como está”, defendeu.
Impacto e críticas
A proposta de isenção para quem ganha até R$ 5 mil foi uma promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A medida, porém, foi criticada por beneficiar principalmente uma parcela de trabalhadores com renda mais alta. Segundo dados do governo, quase 70% da força de trabalho brasileira já está isenta do IR por ganhar até dois salários mínimos.
Em resposta, Marcos Pinto argumentou que o conceito de “classe média alta” deve ser revisto. Com base em estudos do sociólogo Marcelo Medeiros, o secretário disse que os beneficiados estão longe do topo da pirâmide social.
“Quando analisamos a concentração de renda, vemos que 13% da população concentram 60% dela. Sob esse critério, quem ganha R$ 5 mil está na classe média, mas não na classe média alta”, afirmou.
Reforma ideal e sistema desigual
Para o governo, uma reforma estrutural do IR deve ocorrer em um momento mais propício e deve incluir a revisão de regimes como o Simples Nacional e o lucro presumido. Segundo Marcos Pinto, esses sistemas hoje têm alíquotas efetivas bem abaixo da média praticada nos países desenvolvidos — variando de 6% a 11%, enquanto o lucro real das grandes empresas gira em torno de 20%, após benefícios fiscais.
“A carga sobre o consumo no Brasil é alta demais. Já na renda, especialmente sobre a pessoa física, é muito leve. Isso gera um sistema regressivo e desigual, o oposto do que vemos nas economias mais avançadas”, destacou.
Atualmente, a alíquota do IRPJ é de 15%, com adicional de 10% para lucros mensais acima de R$ 20 mil. Com a CSLL, a carga total pode chegar a 34%. Ainda assim, Marcos Pinto defende que o sistema precisa ser mais uniforme.
“O ideal seria ter alíquotas um pouco menores, com menos benefícios e mais previsibilidade. Nos EUA, a alíquota efetiva do IRPJ é de 18%. Na Europa, é de 20%. Estamos acima disso, mas com uma base muito fragmentada”, explicou.
Tributação sobre lucros e folha ainda fora do radar
A taxação de lucros e dividendos, comum em países da OCDE, foi descartada neste momento. Para Pinto, esse tipo de medida só deve ser discutida em uma reforma ampla. O mesmo vale para a proposta de desonerar a folha de pagamentos, defendida por setores empresariais. O governo considera a ideia “meritória”, mas afirma que não há espaço fiscal para implementá-la.
A proposta atual ainda será debatida pelo Congresso Nacional. O relator será o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Enquanto isso, a equipe econômica tenta avançar com o discurso de justiça fiscal e cumprimento de promessas de campanha.
“Queremos tributar quem pode mais no mesmo nível que hoje tributamos quem pode menos. É isso que chamamos de justiça”, concluiu Marcos Pinto.
Com informações do G1.